O PODER DA FARSA
Por Araci Cachoeira
Peço licença ao leitor
Para de algo chato eu falar,
Mais do que chato é cruel
O que eu tenho para tratar,
Sobre o atrevimento do homem
Querendo um rio transportar.
Desde que mundo é mundo
O rio sabe onde correr,
É traçado o seu percurso
E o que temos a fazer,
É cuidar da vida dos rios
Preservar é um dever.
Num tempo que já se foi
Chamado de desbravação,
O Rio São Francisco foi o celeiro
O pai da alimentação,
Peixe de toda espécie
Ali tinha de montão.
Quando os povos indígenas
Da natureza cuidava,
As margens do São Francisco
Alimentos não faltavam,
Porque indígena e natureza
A mesma língua falavam.
Mas foi exatamente o fato
De desbravar sem medir,
Que acabou com as matas
Fez o rio diminuir, este tal desbravamento
Fez a fartura sumir.
Sumiu peixes, sumiu matas
Se some a mata, some a caça,
Resseca a terra, acaba as plantas
Falta comida na praça,
O povo é que paga o pato
São as vítimas da desgraça.
Assim foi com muitos rios
Do nosso imenso Brasil
Numa manobra sutil
Secaram muitas nascentes
Deste torrão varonil.
O motivo nós sabemos
Fazer campos de pastagem,
Criar gado foi a razão
Da enorme malandragem,
Que fez os fazendeiros
Levar nascentes à secagem.
Estou começando das nascentes
Para chegar nos afluentes,
Pois elas é que são as veias
Que levam a água em frente,
Secando a fecundação
É claro que o rio sente.
Quero fazer um pedido
Pensem na situação,
Onde brotavam nascentes
Muitos já não têm vazão
O rio São Francisco vai minguando
Por causa da devastação.
Mesmo com esta realidade
Que até leigo compreende,
Falam na transposição
Que pouca gente defende
Pois é uma farsa montada
Que a um jogo de interesse atende.
Parece um ato de loucura
Um delírio uma surtação,
Mas é o que está acontecendo
Na nossa grande nação,
Um projeto faraônico
Chamado transposição.
A vítima de tal desatino
É o Velho Chico famoso,
Que outrora foi navegável
Um tesouro precioso,
Com muita água e peixe
Era um rio farturoso.
Hoje o Rio são Francisco
Nos causa revolta e tristeza,
Ao invés da revitalização
De refazer a beleza,
Falam em transpor o rio
Isso é agredir a natureza.
Quem não consegue entender
A tal de transposição,
Imagine um enorme canal
Que na verdade é uma ilusão
Carregando o São Francisco
Daqui lá pra o Sertão.
Usam a palavra sertão
Para tentar enganar,
O problema do sertanejo
Não é o rio lá chegar,
Para água lá encontrar.
A transposição do rio São Francisco
É uma farsa do poder,
Que usa o nome dos pobres
Dizendo que vai abastecer,
Água para os estados
Que não tem onde beber.
Neste jogo de interesse
Engana-se quem está achando,
Que a água é para os pobres
Onde estaria o rio chegando,
Na verdade serão os empresários
Que ali vão estar mandando.
Esta mega operação
Que vai nos custar bilhões,
É um desastre para o meio ambiente
E não nos dá soluções,
Ignora os ribeirinhos
E outras populações.
Vai continuar sem água
Quem dela hoje depende,
Os projetos de exportação
É o que o império defende,
Sem ter clareza o projeto
O povo pouco entende.
Não se pode transpor um rio
Com a vazão comprometida,
O rio são Francisco pede socorro
Contra esta ação desvairada,
Ao invés de transposição
Protejamos sua vida.
Ao invés de levar a água
Fazer com que ela aumente,
Cuidando das margens do rio
Dos afluentes e nascentes,
Revitalizem o Velho Chico
Sejam um pouco inteligentes.
Hoje se o povo reclama
É por não se conformar,
Depredaram o meio ambiente
E ainda querem tirar,
O que ainda sobrou
Estão tramando acabar.
Como se não bastasse
A tragédia da barragem,
Inventaram esta vergonha
Esta grande malandragem,
Achando que o povo é trouxa
De apoiar a sacanagem.
Aproveitando a oportunidade
Vou aqui esclarecer,
Quem é contra a transposição
Não é egoísmo, não é querer
Ficar com a água para nós,
É questão de defender.
Defendemos um rio comprometido
Que precisa de cuidado,
Porque entendemos que o rio
Hoje está condenado,
A um futuro de extinção
Por um projeto decretado.
Egoísta na verdade
É quem defende a transposição,
Para atender interesses
Do lucro de exportação,
De hortifrutigranjeiros
E também de camarão.
Isto sim é egoísmo
Querer os carentes tapear,
Usando o nome deles
Para um projeto aprovar,
Falam em gerar emprego
Para o povo enrolar.
Se o problema da seca
Fosse assim resolvido,
É claro que ninguém ia se opor
A gente já teria entendido
Mas sabemos que está errado
Este é um plano falido.
Do custo da grande obra
Não precisa nem a metade,
Para aplicar em projetos
Que resolve de verdade,
O problema da falta d’água
Mudando a realidade.
Por que não fazem o certo?
É fácil de entender
Pequenas obras
Não dá fama nem poder,
Uma obra faraônica
É coisa para aparecer.
Cacimbas e captação
Água em armazenagem,
Isto ajuda o povo
Mas não vai dar reportagem,
Por isto é que preferem
Fazer a grande drenagem.
Se aplicar certo os recursos
Tanto lá como cá,
Capta a água no Nordeste
Aqui reflorestamento vai implantar,
Revitalizando as nascentes
Fazendo a água brotar.
O povo do Nordeste
É um povo inteligente,
Sabe avaliar muito bem
Pensar no mais pra frente,
Hoje o que temos a fazer
É cuidar do meio ambiente.
Gritam os povos indígenas
Lamentam os agricultores,
Ribeirinhos, quilombolas,
Estudantes, professores,
Abominam a idéia
Dos insensatos senhores.
Mas já que insistem na burrada
Avisamos mesmo sofrendo,
Vai haver uma tragédia
O povo está se movendo,
Que a obra vai ser barrada
Todos estão sabendo.
A mobilização já é grande
Para o projeto embargar,
O povo de mala e cuia
No local vai acampar,
Vão ter que pensar duas vezes
Se não vão se ferrar.
Vamos por o pé no barranco
Nós não vamos desistir,
Se é briga que quer o poder
A briga vai existir,
Em torno do Rio São Francisco
Muita gente vai se unir.
Não pensam que vai ser fácil
Com esta farsa do poder,
Do lado de lá tem a grana
Mas do lado de cá tem o querer,
De um povo que está disposto
O Velho Chico defender.
Pelo Rio São Francisco
Contra a transposição,
Uma corrente de forças
Um esforço, um mutirão,
O povo já se levanta
“Dizendo o rio não vai não”.
Belo Horizonte, 09/10/2006
Por Araci Cachoeira
Peço licença ao leitor
Para de algo chato eu falar,
Mais do que chato é cruel
O que eu tenho para tratar,
Sobre o atrevimento do homem
Querendo um rio transportar.
Desde que mundo é mundo
O rio sabe onde correr,
É traçado o seu percurso
E o que temos a fazer,
É cuidar da vida dos rios
Preservar é um dever.
Num tempo que já se foi
Chamado de desbravação,
O Rio São Francisco foi o celeiro
O pai da alimentação,
Peixe de toda espécie
Ali tinha de montão.
Quando os povos indígenas
Da natureza cuidava,
As margens do São Francisco
Alimentos não faltavam,
Porque indígena e natureza
A mesma língua falavam.
Mas foi exatamente o fato
De desbravar sem medir,
Que acabou com as matas
Fez o rio diminuir, este tal desbravamento
Fez a fartura sumir.
Sumiu peixes, sumiu matas
Se some a mata, some a caça,
Resseca a terra, acaba as plantas
Falta comida na praça,
O povo é que paga o pato
São as vítimas da desgraça.
Assim foi com muitos rios
Do nosso imenso Brasil
Numa manobra sutil
Secaram muitas nascentes
Deste torrão varonil.
O motivo nós sabemos
Fazer campos de pastagem,
Criar gado foi a razão
Da enorme malandragem,
Que fez os fazendeiros
Levar nascentes à secagem.
Estou começando das nascentes
Para chegar nos afluentes,
Pois elas é que são as veias
Que levam a água em frente,
Secando a fecundação
É claro que o rio sente.
Quero fazer um pedido
Pensem na situação,
Onde brotavam nascentes
Muitos já não têm vazão
O rio São Francisco vai minguando
Por causa da devastação.
Mesmo com esta realidade
Que até leigo compreende,
Falam na transposição
Que pouca gente defende
Pois é uma farsa montada
Que a um jogo de interesse atende.
Parece um ato de loucura
Um delírio uma surtação,
Mas é o que está acontecendo
Na nossa grande nação,
Um projeto faraônico
Chamado transposição.
A vítima de tal desatino
É o Velho Chico famoso,
Que outrora foi navegável
Um tesouro precioso,
Com muita água e peixe
Era um rio farturoso.
Hoje o Rio são Francisco
Nos causa revolta e tristeza,
Ao invés da revitalização
De refazer a beleza,
Falam em transpor o rio
Isso é agredir a natureza.
Quem não consegue entender
A tal de transposição,
Imagine um enorme canal
Que na verdade é uma ilusão
Carregando o São Francisco
Daqui lá pra o Sertão.
Usam a palavra sertão
Para tentar enganar,
O problema do sertanejo
Não é o rio lá chegar,
Para água lá encontrar.
A transposição do rio São Francisco
É uma farsa do poder,
Que usa o nome dos pobres
Dizendo que vai abastecer,
Água para os estados
Que não tem onde beber.
Neste jogo de interesse
Engana-se quem está achando,
Que a água é para os pobres
Onde estaria o rio chegando,
Na verdade serão os empresários
Que ali vão estar mandando.
Esta mega operação
Que vai nos custar bilhões,
É um desastre para o meio ambiente
E não nos dá soluções,
Ignora os ribeirinhos
E outras populações.
Vai continuar sem água
Quem dela hoje depende,
Os projetos de exportação
É o que o império defende,
Sem ter clareza o projeto
O povo pouco entende.
Não se pode transpor um rio
Com a vazão comprometida,
O rio são Francisco pede socorro
Contra esta ação desvairada,
Ao invés de transposição
Protejamos sua vida.
Ao invés de levar a água
Fazer com que ela aumente,
Cuidando das margens do rio
Dos afluentes e nascentes,
Revitalizem o Velho Chico
Sejam um pouco inteligentes.
Hoje se o povo reclama
É por não se conformar,
Depredaram o meio ambiente
E ainda querem tirar,
O que ainda sobrou
Estão tramando acabar.
Como se não bastasse
A tragédia da barragem,
Inventaram esta vergonha
Esta grande malandragem,
Achando que o povo é trouxa
De apoiar a sacanagem.
Aproveitando a oportunidade
Vou aqui esclarecer,
Quem é contra a transposição
Não é egoísmo, não é querer
Ficar com a água para nós,
É questão de defender.
Defendemos um rio comprometido
Que precisa de cuidado,
Porque entendemos que o rio
Hoje está condenado,
A um futuro de extinção
Por um projeto decretado.
Egoísta na verdade
É quem defende a transposição,
Para atender interesses
Do lucro de exportação,
De hortifrutigranjeiros
E também de camarão.
Isto sim é egoísmo
Querer os carentes tapear,
Usando o nome deles
Para um projeto aprovar,
Falam em gerar emprego
Para o povo enrolar.
Se o problema da seca
Fosse assim resolvido,
É claro que ninguém ia se opor
A gente já teria entendido
Mas sabemos que está errado
Este é um plano falido.
Do custo da grande obra
Não precisa nem a metade,
Para aplicar em projetos
Que resolve de verdade,
O problema da falta d’água
Mudando a realidade.
Por que não fazem o certo?
É fácil de entender
Pequenas obras
Não dá fama nem poder,
Uma obra faraônica
É coisa para aparecer.
Cacimbas e captação
Água em armazenagem,
Isto ajuda o povo
Mas não vai dar reportagem,
Por isto é que preferem
Fazer a grande drenagem.
Se aplicar certo os recursos
Tanto lá como cá,
Capta a água no Nordeste
Aqui reflorestamento vai implantar,
Revitalizando as nascentes
Fazendo a água brotar.
O povo do Nordeste
É um povo inteligente,
Sabe avaliar muito bem
Pensar no mais pra frente,
Hoje o que temos a fazer
É cuidar do meio ambiente.
Gritam os povos indígenas
Lamentam os agricultores,
Ribeirinhos, quilombolas,
Estudantes, professores,
Abominam a idéia
Dos insensatos senhores.
Mas já que insistem na burrada
Avisamos mesmo sofrendo,
Vai haver uma tragédia
O povo está se movendo,
Que a obra vai ser barrada
Todos estão sabendo.
A mobilização já é grande
Para o projeto embargar,
O povo de mala e cuia
No local vai acampar,
Vão ter que pensar duas vezes
Se não vão se ferrar.
Vamos por o pé no barranco
Nós não vamos desistir,
Se é briga que quer o poder
A briga vai existir,
Em torno do Rio São Francisco
Muita gente vai se unir.
Não pensam que vai ser fácil
Com esta farsa do poder,
Do lado de lá tem a grana
Mas do lado de cá tem o querer,
De um povo que está disposto
O Velho Chico defender.
Pelo Rio São Francisco
Contra a transposição,
Uma corrente de forças
Um esforço, um mutirão,
O povo já se levanta
“Dizendo o rio não vai não”.
Belo Horizonte, 09/10/2006
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